Crimes de Maio completa 16 anos
Débora Silva, fundadora das Mães de Maio, afirma que o Estado mata e o judiciário assina embaixo deixando casos como estes impunes
Por Gizele Martins
Há 16 anos ocorria no estado de São Paulo um dos maiores massacres da história do país, os crimes de maio. Durante oito dias, entre 12 e 20 de maio de 2006, policiais e grupos paramilitares de extermínio promoveram uma mentirosa “onda de resposta” ao que se chamou na mídia comercial de “ataques ao PCC”. Foram 564 pessoas – entre mortos e desaparecidos. As vítimas, em sua maioria, foram jovens negros periféricos e afro-indígenas.
Cada uma dessas vítimas deixou famílias em luto e muitas delas estão em luta constante, desde então, pelo direito à memória, à justiça, à verdade e à reparação. É o caso da Débora Silva. Ela perdeu o filho Edson Rogério Silva dos Santos, gari assassinado, aos 29 anos de idade. Em busca por justiça, ela e outras mulheres fundaram no mesmo ano o movimento Mães de Maio.
Em entrevista à Justiça Global, Débora lembrou que, na época, o governo de Alckmin colocou esse massacre como sendo um ataque do PCC. “Mas não foi o PCC e sim o próprio governo. Foi um massacre e ele foi elaborado pela corrupção do Estado. Era época de eleição e o governo fez isso como resposta de que o estado estava sob controle e os nossos filhos pagaram por algo que não era deles”, completou.
Em acordo com Débora, Sandra Carvalho, coordenadora geral da Justiça Global, que atua nestes casos desde a época, afirma que “os chamados crimes de Maio revelaram um Estado que falhou ao permitir uma corrupção que fortaleceu uma facção criminosa, falhou em realizar acordos com uma facção criminosa, ao não proteger seus agentes públicos, falhou em optar por um revide como respostas aos ataques do PCC. Falhou ao acobertar os crimes de maio ou investigá-lo de forma corporativista, falhou em apostar no endurecimento penal e no encarceramento em massa como solução”, avaliou.
Ao longo dos anos, a Justiça Global produziu pesquisas e relatórios sobre os crimes e a organização colheu evidências de que a cúpula da gestão estadual sabia dos planos do PCC e que tentou coibir os ataques sem gerar alerta público para evitar um custo político. “A corrupção praticada por agentes públicos foi uma das principais motivações do PCC para realizar os ataques de 2006”, constatou Sandra.
Infelizmente, estes e outros crimes seguem sem a responsabilização dos envolvidos e o Estado brasileiro continua cometendo chacinas e operações policiais nas favelas e periferias do país. É um Estado que tem como alvo o corpo negro e pobre: “A polícia que mata não é responsabilizada pelos seus crimes, o judiciário também se silencia a cada caso, a maioria ficam impunes. O Estado mata e o judiciário assina embaixo. É uma guerra contra os pobres, negros, favelados. O Estado não é paralelo, o próprio Estado é criminoso. Enquanto não houver justiça, nós mães não deixaremos o Estado dormir, continuaremos em luta”, finalizou Débora.