ONU: relatório Mary Lawlor mostra a violenta realidade das pessoas defensoras de direitos no Brasil

Indígenas Pataxó em protesto em Brasília, Eles são alvos de medida cautelar da Comissão interamericana.

Relatora especial para a situação dos/as defensores/as de direitos humanos esteve no Brasil no ano passado e apresenta documento ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. A Justiça Global contribuiu na agenda no país.

Na próxima quinta-feira (6), a relatora especial das Nações Unidas para a situação dos/as defensores/as de direitos humanos, Mary Lawlor, apresentará oficialmente em Genebra o relatório sobre sua visita ao Brasil no ano passado. As recomendações formuladas serão expostas durante a 58ª Sessão Ordinária do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, iniciada na última segunda-feira (24).

Lawlor realizou missão oficial ao Brasil entre os dias 8 e 19 de abril de 2024. A Justiça Global contribuiu para a organização de sua agenda no país. Durante a visita, a relatora percorreu diferentes territórios na Bahia, no Pará, em São Paulo e no Mato Grosso do Sul. Também se reuniu com autoridades federais e estaduais em Brasília-DF, além de integrantes de organizações da sociedade civil, movimentos sociais, povos indígenas, comunidades quilombolas, advogadas(os) e jornalistas.

O mandato da relatoria busca promover a implementação efetiva da Declaração da ONU sobre Pessoas Defensoras de Direitos Humanos (1998), com foco em casos de tortura, maus-tratos, ameaças, mortes e desaparecimentos.

A especialista acompanhou reunião do Grupo de Trabalho Técnico Sales Pimenta, responsável pela elaboração de um plano nacional de proteção a pessoas defensoras de direitos humanos, comunicadores e ambientalistas, bem como de um anteprojeto de lei para regulamentar a Política Nacional sobre o tema. Os documentos foram submetidos ao Governo Federal em novembro do ano passado.

O relatório já está disponível no site da relatoria.

Evento paralelo: implementando as recomendações do relatório

Além da apresentação na sessão oficial, Mary Lawlor participará de um evento paralelo sobre os caminhos para tornar suas recomendações efetivas.

O evento ocorrerá na quarta-feira (5/3), às 15h, na Sala XXV do Palácio das Nações (Genebra, Suíça). Sandra Carvalho, coordenadora do programa de proteção a defensores/as de direitos humanos e da democracia da Justiça Global, participará remotamente.

A atividade é organizada por: Instituto Brasileiro de Direitos Humanos (IBDH); Universidade Estadual de Goiás (UEG); Universidade de Ulster; Comissão Indigenista Missionária (Cimi); Front Line Defenders; Brasil Office Alliance (BO); Assessoria Popular Maria Felipa; Justiça Global; e Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH).

Principais destaques do relatório

Entre os fatores críticos apontados no documento, destacam-se a falta de responsabilização dos autores de violência contra defensores — frequentemente conhecidos e atuando com a anuência do Estado e a conivência do sistema de Justiça — e a ausência de investigações adequadas. Lawlor também recomenda a regulamentação do uso da força pela polícia.

“Como na grande maioria dos casos em que defensores de direitos humanos são atacados no Brasil, nenhum responsável foi levado à Justiça. A impunidade é particularmente evidente em casos que envolvem defensores pertencentes a grupos racializados e marginalizados, incluindo indígenas, quilombolas e negros. Os assassinatos são frequentemente atribuídos a disputas familiares ou comunitárias, e as investigações são rapidamente arquivadas”, afirma o relatório.

Segundo a pesquisa “Na Linha de Frente”, entre 2019 e 2022, foram registrados 169 assassinatos de defensores de direitos humanos pela Terra de Direitos e pela Justiça Global, com uma situação especialmente grave para mulheres, pessoas trans e indígenas.

Lawlor observa que os defensores atuam simultaneamente em diversas frentes: “Mulheres negras lutam contra o sexismo e o racismo ao mesmo tempo em que combatem as mudanças climáticas. Trabalhadores rurais lutam simultaneamente pelo acesso equitativo à terra e pelos direitos da comunidade LGBT+. Há muitos outros exemplos”, destaca o texto.

No entanto, essa atuação é vista como uma ameaça por aqueles que veem seus privilégios reduzidos pelas conquistas dos defensores, ou seja, aqueles que lucram com a injustiça e a desigualdade.

Recomendações da relatora

Mary Lawlor propõe uma série de recomendações ao governo brasileiro, incluindo:

  • Aceleração da demarcação de terras indígenas e quilombolas, incluindo a urgência no debate sobre a tese do marco temporal e a remoção de invasores dessas terras;
  • Avanço na reforma agrária;
  • Reforma no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH), com aumento de recursos e alcance;
  • Investigação célere e responsabilização rigorosa dos crimes contra defensores;
  • Treinamento obrigatório das forças de segurança sobre direitos humanos;
  • Regulação da atuação empresarial para evitar violações de direitos.
Comparando com o relatório anterior

A especialista destaca que encontrou uma situação semelhante à relatada pela então relatora especial do mesmo tema, Hina Jilani, em sua visita ao Brasil em 2005. Jilani denunciou numerosos relatos de assassinatos e ameaças contra defensores de direitos humanos, especialmente aqueles envolvidos na luta pela terra. A Justiça Global também contribuiu para sua visita à época.

Apesar dos avanços institucionais, a realidade para defensores de direitos humanos no Brasil continua marcada por graves riscos e desafios.

 

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