61 anos do Golpe empresarial-militar de 1964: que democracia somos?

Golpe de 1964
Por Ruggeron Reis*

01 de abril é o dia de rememorar um dos momentos mais trágicos do Brasil República. O golpe empresarial-militar, comandado por elites financeiras e militares de alta patente, pensado e executado para parar as chamadas reformas de base do governo de João Goulart, o Jango, foi também um freio institucional da formação de uma democracia verdadeira no país.

Àquela altura, o Brasil era uma nação em formação ainda mais recente do que é hoje: com menos de 200 anos de independência e menos de 70 de república. Tinha vivido um regime militar após a proclamação que extinguiu o Império; depois, um período conturbado que coroou o governo ora democrático, ora autoritário de Getúlio Vargas por mais de 15 anos. No primeiro momento de maior democracia “estável”, era a hora de avançar, atacar as bases econômicas das opressões e das disputas de classes, que mantinham a desigualdade em alta. Mas o grupo mais prejudicado com essas mudanças – quem mantinha o poder desde a fundação da nação – tinha outros planos.

Foi nesse contexto que se deu o golpe de 1964 e sua agressividade contra seus opositores. Manter subjugadas as populações que já tinham seus direitos negados, enquanto se alinhava ideologicamente com países e empresas que apoiavam aquela nova formação governamental passava essencialmente pela supressão de direitos humanos e de seus defensores.

Métodos até hoje empregados por forças policiais foram desenvolvidos naquele momento: a tortura se tornou padrão, o cárcere com condições subumanas era quase um pré-requisito. Adversários políticos sofrendo violência ligada diretamente às suas ideologias – inclusive membros de agremiações religiosas dos mais diferentes tipos – se tornou comportamento padrão do Estado.

A Lei da Anistia, importante para o retorno de diversos perseguidos políticos à liberdade, foi também o passe para que o Brasil não olhasse e responsabilizasse quem brutalizou povos indígenas em busca de um suposto “progresso”; quem foi pioneiro em destruir a Amazônia na era moderna; e quem foi responsável por amplificar e estruturar o genocídio negro através de violência policial como vemos hoje, abraçando a guerra às drogas como a desculpa perfeita para desumanizar a população antes escravizada e depois tornada “vadia” por diversas leis e ações estatais. Facilitou também que o desaparecimento forçado não fosse tipificado, deixando uma brecha na luta pelo direito à memória e verdade.

Quando a democracia participativa retornou, no movimento que culminou na Constituição de 1988, muita gente – incluindo parte da mídia – parou de prestar atenção e denunciar práticas que antes estavam no centro das manchetes. Isso não significa que elas cessaram: a democracia nunca adentrou as regiões dos latifúndios, os morros e subúrbios, as áreas negras e indígenas. Nunca chegou por completo para mulheres e para qualquer grupo que não a elite que já vivia os gracejos do comando militar. Tortura, cárcere ilegal, desaparecimento forçado: tudo isso seguiu prática normal para esses grupos.

É preciso revisitar essa história. A Comissão Nacional da Verdade foi um passo importante, mas é preciso ir além. Investigar com profundidade as chacinas cometidas em favelas, o processo de formação dos grupos armados nas cidades e no campo e o quanto ele está interligado diretamente com o governo empresarial-militar; uma Comissão Nacional da Verdade Indígena, que foque na investigação da morte e desaparecimentos de indígenas em prol de interesses políticos ou econômicos naquela época.

Se muitas das violações de direitos por parte do Estado e de empresas que hoje presenciamos são heranças desse período, é preciso perguntar: que democracia somos? E o que falta para avançarmos?

Ditadura nunca mais para ninguém! Por uma democracia plena, com direitos humanos garantidos para todas e todos.

*Ruggeron Reis é publicitário e analista de marketing e mídias sociais da Justiça Global. 

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