Alcântara é Quilombola! Em sentença histórica da Corte IDH condena Brasil por violar direitos quilombolas e determina titulação

Decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos reconhece a luta de mais de quatro décadas dos quilombolas de Alcântara, no Maranhão, contra a construção de uma base militar de lançamento de foguetes. O Estado Brasileiro terá um prazo de três anos para garantir o direito de propriedade a todas as Comunidades Quilombolas de Alcântara.

Nesta quinta-feira (13), a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) declarou que o Estado brasileiro é responsável por violar os direitos das comunidades de Alcântara, no Maranhão, na instalação e operação de uma base militar de lançamento de foguetes no território. O Brasil foi condenado por violar diversos direitos, incluindo o da titulação coletiva do território. O anúncio foi transmitido ao vivo no canal do YouTube da Justiça Global

“É uma vitória histórica! O Estado brasileiro foi condenado por crimes e violações cometidos contra nossos quilombos e é obrigado a titular nosso território, e reparar e indenizar as vítimas de suas atrocidades. Temos aí um importante precedente de proteção de comunidades quilombolas do Brasil no Sistema Interamericano”, afirma Danilo Serejo, quilombola, jurista especialista na Consulta Prévia e assessor do Movimento dos Atingidos pela Base Espacial de Alcântara (Mabe).

As violações guardam estreita relação com a implantação do Centro de Lançamento de Foguetes de Alcântara, ao final da década de 70 e início da década de 80. O processo de implantação, que se arrastou por diversos anos, removeu forçadamente um total de 312 famílias de 32 comunidades diferentes, gerando impactos de longo prazo nos modos de vida, com restrições à circulação, ao uso dos recursos naturais, e a atividades extrativistas e de pesca, dentre outras. 

Delegação dos representantes das peticionárias após audiência do caso de Alcântara, no Chile, em abril de 2023. Crédito: Divulgação/Justiça Global.

“Com a vitória de hoje fica reconhecida a importância da titulação do território ancestral dessas comunidades, com a indenização e o pedido de desculpas público do Estado a todas as famílias de Alcântara”, comemora Melisanda Trentin, coordenadora do programa de Justiça Socioambiental da Justiça Global.

Além das desapropriações e remoções compulsórias, a perda do território impactou o direito à cultura, alimentação adequada, livre circulação, educação, saúde, moradia, saneamento básico e transporte de uma centena de comunidades quilombolas.

Centro de Lançamento de Alcântara. Crédito: Divulgação/MCTI.

“Depois de 40 anos de luta, a Corte Interamericana reconheceu que o Estado brasileiro violou uma série de direitos dessas comunidades. Reconheceu a atuação racista do Estado brasileiro em relação ao direito à terra, à saúde, aos modos de vida dessas comunidades. Reconhecer e reparar é o primeiro passo para a justiça. A garantia também dos títulos coletivos abre um precedente gigantesco para outras comunidades quilombolas que estão em luta para garantia de seus territórios”, declarou Glaucia Marinho, diretora-executiva da Justiça Global.

O reconhecimento da responsabilidade do Estado Brasileiro é amplo e reflete a complexidade da cadeia de violações empreendidas pelo Estado nesses mais de quarenta anos.

Dentre os diversos pontos elencados na sentença, a Corte Interamericana determinou que: 

  1. O Estado é responsável pela violação dos direitos à propriedade coletiva e de circulação e residência, por descumprir sua obrigação de delimitar, demarcar, titular e promover a desintrusão do território das Comunidades Quilombolas de Alcântara;
  2. Também é responsável pela violação ao direito ao território por conceder títulos individuais de propriedade ao invés de reconhecer a propriedade coletiva em favor da comunidade;
  3. Além disso, violou o direito das comunidades ao território ao não garantir que elas possam fazer uso pleno de suas terras, e nem oferecer medidas de compensação pelo impacto causado pelas restrições nos períodos de lançamento de foguetes;
  4. A Corte também afirmou que o Estado é responsável por descumprir sua obrigação de realizar uma consulta prévia, livre e informada às Comunidades Quilombolas de Alcântara sobre as medidas que poderiam afetá-las;
  5. Decidiu, ainda, que o Estado é responsável pela violação do projeto de vida coletivo das referidas comunidades;
  6. Como consequência de todos esses impactos, a Corte também reconheceu a responsabilidade pela violação dos direitos à proteção da família, à alimentação adequada, à moradia adequada, à participação na vida cultural e à educação;
  7. Foi ratificado, ainda, que o Estado Brasileiro violou o direito à igualdade perante a lei e à proibição da discriminação baseada na raça e na condição socioeconômica.

“É uma imensa vitória ter acompanhado a sentença de uma ação levada a Corte Interamericana pelas organizações e movimentos do território, que nunca desistiram e sempre resistiram. Hoje ver o nosso Estado brasileiro sendo obrigada a reparar todas essas violações a esse território. Reparação essa onde o mesmo tem a obrigação a titular o território étnico de Alcântara, reparar todas as perdas que nossos antepassados tiveram ao longo dos anos. Para nós, enquanto movimento, enquanto mulheres, é muito importante a gente ver que buscando e resistindo, a gente consegue. Não foi fácil, não é fácil. A Corte agora vai acompanhar o cumprimento dos itens da sentença. Viva o território quilombola! Viva a luta de Alcântara”, celebra Maria do Nascimento, quilombola e liderança do Movimento de Mulheres Trabalhadoras de Alcântara (Momtra).

Sentença obriga Estado brasileiro a titular território e instalar mesa de diálogo permanente

A partir do reconhecimento deste rol de violações, a Corte Interamericana determinou algumas obrigações ao Estado Brasileiro, dentre as quais se destacam:

  • A titulação coletiva que reconheça os 78.105 hectares de seu território, conforme o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação, datado de 2008, além de delimitar, demarcar e promover a desintrusão adequada do território;
  • O Estado, enquanto não concluir a titulação, demarcação e desintrusão do território das Comunidades Quilombolas de Alcântara, deverá abster-se de realizar atos que possam afetar sua existência, valor, uso ou gozo;
  • Deverá instalar uma mesa de diálogo permanente de comum acordo com as Comunidades Quilombolas de Alcântara;
  • A Corte determinou, ainda, a realização de um ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional em relação aos fatos e violações reconhecidos pela Corte Interamericana.
  • Por fim, determinou que o Estado deve indenizar as comunidades pelo dano material e imaterial sofrido ao longo dos anos.

A diretora-executiva da Justiça Global destacou a mesa de diálogo como uma garantia para que as comunidades de Alcântara possam opinar sobre projetos que podem ser instalados em seus territórios. “A Consulta Prévia, Livre e Informada – estabelecida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho – é um direito das comunidades quilombolas, povos indígenas e comunidades tradicionais. Respeitar essa determinação é um dever do Estado brasileiro”.

Após mais de 20 anos de tramitação, enfim a justiça

Ao longo de mais duas décadas de tramitação na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, o governo brasileiro teve diversas oportunidades de reparar as violações, mas não o fez. Os quilombos de Alcântara ainda não contam com o título de propriedade coletiva de seu território tradicional.

A denúncia foi apresentada à Comissão Interamericana de Direitos Humanos em 2001 por representantes de comunidades quilombolas do Maranhão, o Movimento dos Atingidos para Base de Alcântara (MABE), a Justiça Global, a Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH), a Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Maranhão (FETAEMA), Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Alcântara (STTR) e a Defensoria Pública da União (DPU) – que entrou no caso em 2017. A Associação do Território Quilombola de Alcântara (Atequila) e o Movimento das Mulheres de Alcântara (Momtra) também entraram com processo na Corte Interamericana. 

Após a Comissão apresentar à Corte o caso em 2022, a audiência foi realizada em abril de 2023 em Santiago do Chile, com uma delegação de cerca de 20 pessoas para a representação dos peticionários (recupere aqui: parte 1; parte 2 e parte 3).

Na ocasião, o governo brasileiro reconheceu parcialmente as violações e manifestou um pedido de desculpas. As organizações peticionárias se manifestaram logo após a audiência, alegando que o reconhecimento, além de incompleto, não apresentava medidas efetivas para imediata titulação e reparação dos quilombolas.

Leia aqui: Pedido de desculpas do Estado para quilombolas de Alcântara é incompleto e suscita dúvidas – Justiça Global

Na véspera da audiência perante a Corte IDH, o governo também anunciou a criação de um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) para a titulação do território, que culminou num acordo publicado em outubro do ano passado. A Justiça Global se manifestou sobre o documento, ponderando a falta de efetividade e a possível fragilização do processo em curso de deliberação da Corte Interamericana após mais de 20 anos de tramitação no sistema interamericano.

Leia nota na íntegra: Justiça Global se manifesta sobre acordo firmado entre comunidades quilombolas de Alcântara e Governo Federal

“A gente fica emocionado de ver que não foram em vão esses anos de luta, de desgaste, de embate. Muitas vezes, nós estivemos cansados e até pensamos em desistir, mas a luta era maior e necessária. E hoje, embora a gente saiba que ainda não é tudo e há muito para ser feito, esse resultado é sim uma vitória importantíssima não só para Alcântara mas para todo o Brasil na luta pela garantia do direito das comunidades quilombolas”, diz Neta Serejo, quilombola e presidente do Movimento dos Atingidos pela Base Espacial de Alcântara (Mabe).

Demora em titulação de territórios quilombolas é violação crônica no Brasil

A sentença também reconheceu a omissão do Estado brasileiro em garantir os direitos territoriais e titular o território. O caso evidencia a estrutura fundiária e acesso à terra marcados pelo racismo no Brasil.

A situação, infelizmente, não está restrita à Alcântara. Uma pesquisa da Terra de Direitos de 2023, por exemplo, mostrou que – caso o governo federal mantenha o ritmo atual – levará 2.708 anos para concluir o processo de regularização fundiária dos 1.857 quilombos com regularização pendente.

“A titulação dos territórios quilombolas no Brasil caminha a passos terrivelmente lentos, o que significa maior vulnerabilização da integridade física, dos modos de vida e dos territórios”, observou a diretora-adjunta da Justiça Global, Daniela Fichino.

Os direitos territoriais dos quilombolas foram incluídos no ordenamento jurídico brasileiro na Constituição Federal de 1988 e regulamentado pelo Decreto 4.887/2003. O documento contribui para a autonomia da defesa dos territórios em face, por exemplo, à especulação imobiliária, ao agronegócio e outros empreendimentos – privados ou estatais. Também abre portas para que políticas públicas básicas, como saúde e educação, cheguem ao território e garantam a sobrevivência das comunidades.

O processo de titulação hoje é organizado em seis etapas: autodeterminação (com a certificação emitida pela Fundação Cultural Palmares), elaboração e publicação do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), emissão da portaria de reconhecimento, dos decretos de desapropriação e, enfim, o título de propriedade coletiva – todas essas sob responsabilidade do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Segundo a pesquisa da Terra de Direitos, até maio de 2023, somente 53 territórios tradicionais tinham concluído todas as etapas no processo de regularização fundiária quilombolas. Até o período, 2.840 estavam ainda na primeira fase, com a certificação.

Outro levantamento, do Instituto Socioambiental (ISA) em parceria com a Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq), revelou que 98,2% dos territórios quilombolas do Brasil estão ameaçados por obras de infraestrutura, requerimentos minerários ou por imóveis particulares que se sobrepõem aos limites da área de ocupação tradicional.

Em julho de 2024, em decisão histórica, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) recomendou que o Brasil titule o território das comunidades quilombolas de Alcântara e respeite o direito à Consulta Prévia, Livre e Informada, previsto na Convenção n.169. Foi a primeira vez na história que a OIT decidiu sobre um caso de comunidades tradicionais afrodescendentes no mundo.

Saiba mais: Em decisão histórica, OIT recomenda que Brasil titule o território quilombola de Alcântara

Alcântara é quilombola!

Com mais de 18 mil pessoas, o município de Alcântara, na região metropolitana de São Luís, concentra a maior população quilombola do país: quase 85% das mais de 18 mil pessoas, segundo o Censo do IBGE de 2002, distribuídas em quase 200 comunidades. Foi a primeira edição da pesquisa a levantar o dado. Conforme os resultados, atualmente residem 1.327.802 pessoas quilombolas no Brasil, correspondendo a 0,65% da população brasileira. Quase 70% dessa população está na Região Nordeste e metade está apenas na Bahia e no Maranhão.

Uma das primeiras regiões do Brasil a receber negros escravizados da África, às vésperas da independência em 1822, o Maranhão tinha o maior percentual de pessoas escravizadas do Império, em torno de 55%. É a partir do início do século XIX que o registro dos quilombos na região de Alcântara, cujas primeiras ocorrências datam do início do século XVIII, aumentou significativamente.

O Censo de 2022 contou 494 Territórios Quilombolas oficialmente delimitados, espalhados por 24 estados e no Distrito Federal. Esses territórios são lares para 203.518 pessoas, sendo a maioria, 167.202, quilombolas (82,16%), e o restante, 36.316, não quilombolas (21,72%). Isso significa que cerca de 12,6% dos quilombolas no Brasil vivem em áreas oficialmente reconhecidas, enquanto 87,4% estão em áreas que ainda não foram formalmente reconhecidas.

Saiba mais sobre o caso

O projeto do Centro de Lançamento de Alcântara começou a ser elaborado ainda na década de 1970, durante a ditadura militar. Já na Redemocratização, entre 1986 e 1988, foram desapropriadas 312 famílias de 32 povoados de suas terras. Nenhum estudo de impacto sociocultural e ambiental ou processos de consulta e consentimento prévios foram realizados pelo Governo Federal ou Estadual, conforme preconiza a Convenção no 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil em 2002, em vigor desde 2003.

Nas sete agrovilas nas quais as comunidades foram reassentadas, elas sofreram uma alteração dos costumes e práticas e são até os dias atuais privadas de condições adequadas de vida, com a falta de saneamento básico e de políticas públicas de educação, transporte e saúde, de liberdade perante o território e de organização social. 

O pedido de titulação está em aberto antes mesmo da denúncia e o processo está pronto para assinatura do Executivo Federal desde 2008, sem, no entanto, qualquer sinalização de encaminhamento, o que compromete ainda mais a garantia das formas tradicionais de organização e vida. As comunidades foram certificadas pela Fundação Cultural Palmares em 2004 e identificadas e delimitadas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) em 2008. 

As famílias expulsas de seus territórios enfrentam até hoje os impactos nos sistemas alimentares e de renda. A terra das agrovilas não têm tamanho ou qualidade para agricultura e cultivo de alimentos fundamentais, como descreve a quilombola Maria Luzia Silva Diniz. Conhecida como Luzia do Marudá – nome do seu antigo povoado, ela foi removida em 1987 para uma das agrovilas.

“Foi muito difícil para nós. A Aeronáutica nos tirou da maior riqueza dos recursos naturais para nós e nos colocou aqui nessa área onde as terras eram improdutivas, não tinham condições nenhuma de sustentabilidade para as famílias. Não existia nem um pé de fruta e a pesca ficou muito distante. O povo vivia da pesca e da roça. A partir daí, nós passamos a conhecer a fome de perto. Antes, nós não tínhamos uma casa bonita de alvenaria. Nós tínhamos casas humildes, tapadas de taipa e cobertas de palha de coco de babaçu. Mas nós éramos felizes. Nossos filhos brincavam e eram felizes porque tinham o que comer, tinha rio bonito e água boa para beber. Ficou tudo para trás”, descreve Luzia do Marudá. 

As comunidades também eram impedidas de acessar determinados lugares, como o território onde seus ancestrais foram enterrados e o litoral, comprometendo atividades de caça e pesca. Além disso, a definição arbitrária dos novos assentamentos não respeitou as relações de vizinhança, os laços de amizade e de parentesco que fazem parte da organização social de território étnico. O governo brasileiro ainda reduziu o módulo rural de Alcântara de 35 para 15 hectares. 

Até hoje, os filhos das famílias deslocadas para as agrovilas têm que dividir os pequenos lotes concedidos aos seus pais. Sem possibilidade concreta de sobrevivência, muitos jovens vão para os centros urbanos, principalmente para os bairros de Camboa, Liberdade e Vila Embratel da capital São Luís.

Morador da agrovila Espera, Inaldo Faustino Silva Diniz foi reassentado em 1988 e conta que uma das estratégias do governo foi a de incidir sobre a juventude quilombola para atuar no despejo. “Ainda muito jovem, no fim da década de 70, eu ouvia os mais velhos falando que viria um grande projeto para Alcântara. No início dos anos 80, isso se concretizou em um decreto de desapropriação que dizia que, mais cedo ou mais tarde, essas comunidades que viviam no litoral seriam transferidas. Por volta de 1982, chegaram os primeiros militares em Alcântara, recrutando [para treinamento em São Paulo] alguns jovens para se tornarem militares, com o pretexto de que iam mudar de vida. Mas o que ocorreu foi que eles foram chamados para convencer seus pais de que anos depois eles seriam transferidos”. 

Já os grupos que permaneceram em seus territórios tradicionais estão desde então sob constante tensão e ameaças de novas expulsões para expansão da base espacial pelo litoral, com projetos planejados e/ou executados pelo Estado nos últimos anos, repetidamente alheios à população local. A situação gera uma enorme insegurança sobre o futuro das várias comunidades. 

Elas ainda têm vivido limitações impostas pelo governo brasileiro à relação dos quilombolas de Alcântara com o meio ambiente, como a interdição da pesca em determinados períodos e a restrição na construção de novas casas em alguns espaços. Além disso, ainda hoje, os povoados atravessados pelo projeto espacial não têm nenhuma informação sobre possível poluição do ar ou sonora dos, mesmo que raros, lançamentos de foguetes. 

“A atitude do governo brasileiro acabou privando os quilombolas alcantarenses de poderem até mesmo se relacionar com seus locais sagrados, cultuarem e zelarem seus ancestrais”, relatam integrantes do MABE. 

Ao longo de duas décadas de tramitação no Sistema Interamericano, o governo brasileiro teve diversas oportunidades – inclusive provocadas pela CIDH – para reconhecer e reparar as violações. Porém, ao contrário, manteve a postura arbitrária, violenta e desrespeitosa contra as comunidades quilombolas de Alcântara, atestando o racismo institucional contra os afrodescendentes no Brasil. 

Entre as violações mais recentes, destaca-se a ação arbitrária no território em 2008, que levou as lideranças de Alcântara a denunciarem o Estado à OIT, por meio do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, por mais uma vez não cumprir a Convenção 169 no Projeto Alcântara Cyclone Space – Acordo de Cooperação Tecnológica Brasil – Ucrânia. As empresas contratadas invadiram e depredaram roças das comunidades de Mamuna e Baracatatiua na tentativa de implantar outros três sítios de lançamento de aluguel. 

Em 2019, o Acordo de Salvaguardas Tecnológicas firmado pelo governo de Jair Bolsonaro com os Estados Unidos, com finalidades comerciais, ignorou até mesmo a recomendação da Comissão Interamericana de Direitos Humanos feita na segunda audiência sobre o caso de realizar estudo e consulta prévias aos quilombolas. 

(Conheça o “Texto base para o protocolo comunitário sobre Consulta e Consentimento Prévio e Informado (CCPLI) das comunidades do território étnico de Alcântara–MA”, de 2019).

No ano seguinte, em meio à pandemia de Covid-19, o Governo Bolsonaro determinou novas remoções para tal projeto – que afetariam ao menos 800 famílias, principalmente das comunidades de Mamuna e Canelatiua. O despejo, no entanto, foi suspenso pela justiça e, após o Senado dos EUA vetar o uso de dinheiro do país para a remoção das comunidades quilombolas, o Brasil revogou a resolução. 

 

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