O trabalhador rural e sindicalista de Rondon do Pará (PA), José Dutra da Costa, conhecido como Dezinho, foi assassinado em 21 de novembro de 2000 por defender direitos humanos, trabalhistas e a reforma agrária, além de denunciar trabalho análogo à escravidão.
Na véspera de completar 23 anos do assassinato do líder sindical José Dutra da Costa, em Rondon do Pará (PA), a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, da Organização dos Estados Americanos (OEA), divulgou relatório em que constata que o Brasil ainda não cumpriu totalmente as cláusulas do Acordo de Solução Amistosa do caso. A CIDH segue supervisionando as medidas.
Leia o RELATÓRIO No. 114/23 CASO 12.673
O crime ocorreu em 21 de novembro de 2000. Dezinho, como era conhecido, sofria ameaças desde que foi eleito presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará, nos anos 1990. Ele teve papel central na luta por direitos trabalhistas, tendo apresentando diversas denúncias sobre crimes cometidos por latifundiários da região, como trabalho análogo à escravidão, desmatamento, grilagem de terras, cemitérios clandestinos em propriedade privada e assassinatos de outros trabalhadores rurais e líderes de movimentos sindicais por proprietários de terras da região.
O caso foi apresentado à CIDH em 2004, pela Justiça Global, o Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará, a Comissão Pastoral da Terra e a Terra de Direitos. Em 2010, as peticionárias assinaram o Acordo de Solução Amistosa em que o Estado brasileiro reconheceu a falha em investigar e punir os responsáveis, além de assumir o compromisso de dar garantias aos familiares.
O documento contém 24 cláusulas. Onze delas tiveram cumprimento integral, segundo a Comissão, e outras nove foram parcialmente, mas substancialmente cumpridas. A CIDH vai continuar acompanhando os aspectos do acordo que ainda não foram totalmente cumpridos, com destaque para a construção de um memorial em homenagem à Dezinho e luta pela reforma agrária, a instalação de um infocentro no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará e construção de poços artesianos em assentamentos do Município.
“A Comissão aprecia os esforços do Estado brasileiro para buscar a resolução dos casos perante o sistema de petições e casos individuais, por meio do mecanismo de solução amistosa, e para alcançar a plena implementação deste acordo. Também elogia a parte peticionária por todos os esforços empreendidos para participar da negociação e promoção deste acordo de solução amistosa”, declarou a CIDH em seu comunicado.
Apesar da CIDH ter considerado cumprida a cláusula sobre promoção do Programa de Proteção aos Defensores, a coordenadora da Justiça Global, Sandra Carvalho, ressalta que o Programa de Proteção dos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas encontra-se extremamente fragilizado e muitos ainda são os desafios para se tornar uma política pública efetiva.
O GTT Sales Pimenta, instituído através do DECRETO Presidencial n.º 11.562, DE 13 DE JUNHO DE 2023, tema a tarefa se, nos próximos meses, elaborar o Plano Nacional de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas e elaborar proposta de anteprojeto de lei que formalize a política de proteção.
Andamento na justiça interna
Em dezembro do ano passado, o acusado de intermediador do crime, Rogério de Oliveira Dias, foi condenado pelo Tribunal do Júri do Pará. Ao todo, seis pessoas são acusadas. Os latifundiários Lourival de Souza Costa e Décio José Barroso Nunes foram apontados como mandantes. Costa foi absolvido em 2013 e Nunes responde em liberdade aos recursos da condenação de 2019 à prisão. Um dos quatro pistoleiros está foragido.
A viúva de Dezinho, Maria Joel Dias da Costa, chegou a ser intimidada pelo advogado de Délcio Nunes, que também deslegitimou trabalhadores rurais ligados ao Movimento de trabalhadores/as rurais ligados ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na audiência.
Dona Maria assumiu a presidência do sindicato após a morte de seu companheiro. Diante das inúmeras ameaças que passou a receber, foi inserida no Programa de Proteção de Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas e vive sob escolta policial desde 2005.
Escala da violência no campo
Ainda hoje, o estado do Pará lidera os números relacionados à violência no campo. O conflito agrário atinge todo o país. A Comissão Pastoral da Terra apontou cinco assassinatos de lideranças rurais apenas entre 27 de outubro e 14 de novembro deste ano nos estados do Pará, do Maranhão, de Pernambuco e da Paraíba.
Pesquisa da CPT registra 1.572 ocorrências de conflitos por terra no país apenas em 2022, quase 18% a mais que no ano anterior. Mais de 181 mil famílias estavam na mira desse tipo de conflito, entre violências contra a ocupação e a posse e contra as pessoas, além das ações coletivas de ocupação de terras e acampamentos.
A maioria (80%) das pessoas defensoras de direitos humanos violentados entre 2019 e 2022 atuava na defesa de direitos ligados à terra, território e meio ambiente, aponta a pesquisa Na Linha de Frente – Violência contra defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil (2019 a 2022), realizada pela Justiça Global e a Terra de Direitos. No período, 140 foram assassinados.
Diante da situação, o encaminhamento de um caso é elementar o compromisso do Estado brasileiro em fazer justiça e não permitir a repetição desses crimes.
Agora nós vamos pra luta, a terra que é nossa ocupar!
A terra é pra quem trabalha. A história não falha, nós vamos ganhar!
Já chega de tanto sofrer, já chega de tanto esperar!
A luta vai ser tão difícil, na lei ou na marra nós vamos ganhar!
Quem gosta de nós somos nós, e aqueles que vem nos ajudar!
Por isso confia em quem luta, a história não falha. Nós vamos ganhar!
Se a gente morrer nessa luta, o sangue será a semente!
Justiça vamos conquistar, a história não falha. Nós vamos ganhar!
Hino da Reforma Agrária.