Condenação do Greenpeace pela justiça dos EUA pode ser maior caso de SLAPP da história; ONG vai recorrer

Da sigla em inglês, SLAPP (Strategic Lawsuit Against Public Participation) é uma estratégia de criminalização frequentemente usada por empresas contra pessoas e organizações defensoras de direitos humanos.

A sentença do júri da Dakota do Norte, nos Estados Unidos, desta quarta-feira (19/03) determinou que a organização não-governamental de proteção do meio ambiente Greenpeace pague cerca de U$ 667 milhões por protestos realizados contra a empresa de oleodutos Dakota Access Pipeline, da Energy Transfer, por empreendimento próximo à Reserva Indígena Standing Rock. 

Stand With Standing Rock Nov 11-15 2016. Credit: Flickr/Leslie Peterson. CC BY-NC 2.0.
Stand With Standing Rock Nov 11-15 2016. Credit: Flickr/Leslie Peterson. CC BY-NC 2.0.

O Greenpeace afirma que vai recorrer, mas caso o veredito seja confirmado pelas instâncias judiciais superiores, poderá ser o maior caso de SLAPP (Strategic Lawsuit Against Public Participation, na sigla em inglês), ou assédio judicial, em termos de valores. A estratégia jurídica tem sido recorrentemente usada por empresas na tentativa de silenciar organizações e pessoas que defendem direitos e até ameaçá-las à falência. 

Leia a nota do Greenpeace. 

A rede global do Greenpeace realizou uma série de ações em solidariedade e denunciando o processo Slapp. Na imagem, integrantes do Greenpeace República Tcheca. Foto: © Ray Baseley / Greenpeace.

O Guia de Proteção para Defensoras e Defensores de Direitos Humanos, elaborado pela Justiça Global, identifica esse tipo de ação como “criminalização”, ao incitar “a despolitização das questões que envolvem as lutas pela afirmação de direitos e da resistência legítima dos movimentos sociais”. O texto destaca que essa estratégia tem sido a mais utilizada contra defensores/as de direitos humanos. 

“A utilização indevida do direito penal para criminalizar as defensoras e os defensores de direitos humanos desencoraja a atividade de promoção e proteção dos direitos humanos. Criminalizar defensoras e defensores por atividades legítimas produz medo em outras defensoras/es e pode resultar no silenciamento de suas reivindicações.”

Acesse o Guia de Proteção para Defensoras e Defensores de Direitos Humanos | Justiça Global

Os protestos foram realizados entre 2016 e 2017. Ao lado de indígenas da etnia Sioux, o Greenpeace denunciava que o oleoduto poderia envenenar a água local e agravar mudanças climáticas. As manifestações foram marcadas por uma resposta violenta das autoridades estadunidenses contra os manifestantes. Os agentes da lei chegaram a usar canhões de água contra os manifestantes, o que fez com que 26 pessoas fossem levadas ao hospital com fraturas ósseas ou hipotermia, por conta do frio que fazia na época.

Protestos #NoDAPL em 2016. Crédito: Rob Wilson.

A tubulação, já concluída, transporta cerca de 40% do petróleo produzido na região de Bakken, em Dakota do Norte. O veredito incluiu danos por difamação, invasão de propriedade e conspiração. 

A nota do Greenpeace afirma que o júri era “composto por 9 pessoas com laços diretos com a indústria dos fósseis”. Também acusa a empresa de ação racista ao desconsiderar o protagonismo dos povos indígenas e agir em tentativas de “suprimir a liberdade de expressão e o poder de ação das pessoas”. 

Mineradoras já usaram estratégias contra organizações e defensoras/es brasileiros/as

No Brasil, empresas com diversos impactos socioambientais têm adotado esse tipo de estratégia, na tentativa de deslegitimar a atuação de quem defende seus direitos. 

Povo Awá Guajá, da Terra Indígena Caru, no Maranhão. Foto: Madalena Borges/Cimi Regional Maranhão.

Em 2023, a 1ª Vara Cível do Maranhão, indeferiu os pedidos impetrados pela mineradora Vale S/A contra o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – Regional Maranhão e as missionárias e professoras Madalena Borges e Rosana Diniz, em razão da ocupação da Estrada de Ferro Carajás (EFC) pelos indígenas Awá Guajá, da Terra Indígena (TI) Caru, em 2016.

A empresa também acionou a justiça em 2016 contra 13 pessoas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana. Famílias de Belo Oriente–MG, Aimorés–MG e Mascarenhas–ES trancaram a ferrovia de minério da empresa por cerca de 10 horas, reivindicando que a solução de problemas com a água e que levasse em conta o número real de atingidos. 

Em 2015, após ação judicial movida pela Vale, moradores e lideranças comunitárias da vila Casa Azul, na área rural de Buriticupu–MA, foram proibidos de protestar sob pena de multa de cinco mil reais por cada dia, após carta apresentando impactos causados pela construção e operação também da Estrada de Ferro Carajás. 

No Pará, a mineradora canadense Belo Sun tem processado ativistas e defensores ambientais no Brasil que se opõem ao seu projeto de mineração na região da Volta Grande do Xingu, no Pará. Em outubro de 2023, a empresa entrou com uma ação penal contra mais de 30 pessoas, incluindo agricultores locais, líderes comunitários e membros de organizações nacionais e internacionais, acusando-os de “esbulho possessório” — ou seja, posse ilegal de propriedade. Entre os alvos dessa ação estão organizações como a Amazon Watch, International Rivers e o Movimento Xingu Vivo Para Sempre. 

Veja mais: Mineradora Belo Sun tenta criminalizar defensores de direitos humanos na Volta Grande do Xingu – Justiça Global

Justiça Global manifesta apoio à organização

A Justiça Global se solidariza com as/os trabalhadoras/es e ativistas do Greenpeace e compartilha a indignação diante do assédio judicial e político contra defensoras/es de direitos humanos em assuntos ambientais. Também manifesta apoio aos indígenas Sioux na luta contra as violações da empresa aos seus direitos. 

 

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