Em 7 de abril de 2019, o músico Evaldo Rosa dos Santos foi morto enquanto dirigia seu carro acompanhado de sua família no Rio de Janeiro. O veículo foi alvejado por mais de 80 tiros de fuzil disparados por militares que participavam da “Operação Muquiço”. Luciano Macedo, um catador que tentou socorrer Evaldo, também foi atingido e faleceu posteriormente. No total, foram disparados 257 tiros.
O Superior Tribunal Militar (STM) retomará, no próximo dia 18 de dezembro, o julgamento da Ação Penal Militar envolvendo militares do Exército Brasileiro acusados de participar de uma operação que resultou na morte de duas pessoas: Evaldo Rosa dos Santos e Luciano Macedo. O caso, um dos mais emblemáticos dos últimos anos, que ganhou grande repercussão nacional e internacional, revisita questões cruciais sobre o uso da força letal por agentes do Estado e a competência da Justiça Militar para julgar crimes dolosos contra a vida de civis.
Contextualização do caso
No dia 7 de abril de 2019, Evaldo Rosa dos Santos foi morto enquanto dirigia seu carro acompanhado de sua família no Rio de Janeiro. O veículo foi alvejado por mais de 80 tiros de fuzil disparados por militares que participavam da “Operação Muquiço”. Luciano Macedo, um catador que tentou socorrer Evaldo, também foi atingido e faleceu posteriormente. No total, foram disparados 257 tiros.
Controvérsias do processo
Durante o julgamento do STM, iniciado em 1º de março de 2024, o ministro Carlos Augusto Amaral Oliveira propôs a desclassificação do crime de homicídio doloso para homicídio culposo, o que reduziria as penas de 30 para 3 anos de prisão em relação à morte de Luciano Macedo. Em relação à morte de Evaldo Rosa, o ministro sugeriu a absolvição dos oito militares, alegando que eles agiram em legítima defesa de terceiros, diante de uma suposta perseguição a assaltantes. O revisor José Coelho Ferreira acompanhou o voto do relator. O julgamento foi interrompido por um pedido de vista, e a data para continuidade foi remarcada para o dia 18 de dezembro.
Críticas e repercussão
O caso tem sido apontado como um marco no debate sobre a aplicação da Lei nº 13.491/2017, que ampliou o rol de crimes julgados pela Justiça Militar, permitindo que crimes dolosos contra a vida de civis praticados por militares sejam julgados por tribunais militares. Especialistas e organizações da sociedade civil afirmam que essa expansão prejudica a imparcialidade e a efetividade dos julgamentos, especialmente em situações que envolvem violência policial.
A abordagem militar no caso de Evaldo e Luciano é considerada desproporcional e injustificável à luz dos parâmetros constitucionais e dos tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é signatário. A execução sumária de ambos, sem qualquer indício de confronto ou ameaça iminente, foi considerada uma violação grave dos protocolos de abordagem e uso da força.
Impactos no contexto do racismo institucional
Organizações de direitos humanos destacam o caráter racialmente discriminatório da violência policial no Brasil. O perfilamento racial, presente em grande parte das ações policiais, está vinculado ao legado histórico de exclusão e violência contra pessoas negras. O caso Evaldo e Luciano é emblemático e retrata essa prática cotidiana, pois revela como pessoas negras são desproporcionalmente abordadas e vitimadas em operações letais de agentes do Estado. Relatórios da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos destacam que o racismo estrutural e a violência estatal são fenômenos interligados no Brasil.
Consequências de uma eventual absolvição
Caso o STM decida pela absolvição dos militares, o impacto sobre o Estado democrático de direito será significativo. A decisão não apenas pode reforçar a falta de responsabilização de agentes de Estado que abusam do uso da força, mas também pode estabelecer um precedente perigoso para futuras operações militares em áreas civis.
Próximos passos
Na última semana, a Justiça Global, a Conectas Direitos Humanos, o Instituto de Defesa da População Negra (IDPN) e o Odara Instituto da Mulher Negra fizeram um apelo urgente à ONU, pedindo que a organização se pronuncie sobre o caso e recomende ao Estado brasileiro que a Justiça Militar se abstenha de julgar crimes cometidos contra civis. As organizações seguirão acompanhando de perto o julgamento e os resultados do apelo. Também continuarão mobilizando a sociedade civil organizada em relação ao caso e recorrerão a outros organismos internacionais para que as mortes de Evaldo e Luciano tenham uma investigação e julgamento céleres, imparciais e em órgãos não ligados às forças de segurança.