Esta terça-feira, dia 14, representa um marco para a Justiça brasileira e para os Direitos Humanos, com a realização do primeiro júri federalizado da história do país, o dos cinco acusados pela execução do advogado Manoel Mattos, no Recife (PE). Ele foi morto em 2009 por denunciar mais de 200 mortes causadas por grupos de extermínio na divisa da Paraíba com Pernambuco, conhecida como “Fronteira do medo”. Para garantir a proteção do advogado nessa ação, a Organização dos Estados Americanos (OEA) concedeu, em 2002, medidas cautelares para que o Estado brasileiro desse proteção ao defensor e sua família. Em 24 de janeiro de 2009, entretanto, Mattos foi assassinado na Paraíba, quando estava há dois anos sem escolta policial.
Diversas entidades e organizações, como a Justiça Global e a Dignitatis – Assessoria Técnica Popular, conseguiram, em 27 de outubro de 2010, a federalização das investigações e do julgamento da morte de Mattos, por meio da instauração do Incidente de Deslocamento de Competência (IDC). Esse mecanismo é previsto na Constituição desde 2004 para crimes que envolvam grave violação de direitos humanos.
Assim, o caso foi transferido da Justiça estadual para Justiça Federal da Paraíba, onde o julgamento foi frustrado em 2013 por falta de jurados. Muitos não compareceram ao júri por medo de virar alvo dos acusados. Assim, ele foi transferido novamente para a Justiça Federal em Recife, onde será finalmente julgado nesta terça.
A mãe do advogado, Nair Ávila, até hoje vive sob proteção, ameaçada por continuar a luta de seu filho, assim como a promotora Rosemary Souto Maior, que atuou nas denúncias junto a Mattos. Em coletiva realizada nesta segunda-feira, dia 13, a mãe de Mattos ressaltou a importância do julgamento para o fim da impunidade desses grupos de extermínio: “Eu não quero ver outras mães chorando como eu estou chorando. Meu filho veio ao mundo para fazer o bem para os menos favorecidos. Sua luta era por eles e temos que conseguir esse julgamento por eles também”.
Com a realização do julgamento, a expectativa é de que tanto o Judiciário quanto os governos estaduais e federal deem mais atenção às ameaças aos defensores de Direitos Humanos e também àqueles que têm suas garantias violadas. “O Estado brasileiro tem obrigação não apenas de garantir a segurança dos defensores, mas de fazer isso de forma que não os impeça de continuar com suas lutas. Para isso, os programas de proteção nacional e estaduais precisam ser fortalecidos urgentemente”, afirmou Sandra Carvalho, coordenadora da Justiça Global.