Por Fundação Rosa Luxemburgo
O “desenvolvimento” como equivalência de “bem estar”, “prosperidade” e “modernidade”, ou ainda, o conceito de “crescimento” como perspectiva de superação das profundas desigualdades sociais que marcam a América Latina desde o período colonial, virou um mantra entoado tanto pelos governos quanto por demais interesses internos e externos que atuam sobre as políticas econômicas da região.
A engenharia financeira que visa possibilitar tal crescimento e desenvolvimento (preferencialmente ilimitados) tem na exploração dos bens naturais um dos seus principais pilares, a despeito dos reveses que o extrativismo intensivo impõe aos territórios explorados – como a interferência, recorrentemente de maneira brutal, nos modos de vidas das populações afetadas, no meio ambiente e, por vezes, nas próprias legislações domésticas.
O aumento de violações estatais e privadas (ou ainda público-privadas) de direitos humanos em territórios ocupados por grandes projetos extrativos na América Latina vem intensificando, por um lado, os questionamentos sobre o modelo desenvolvimentista – e sobre o próprio conceito de desenvolvimento – adotado por grande parte dos governos da região. Por outro, também têm se fortalecido os intercâmbios de populações afetadas sobre instrumentos e métodos de defesa e resistência.
E é neste âmbito que ocorre o debate sobre a eficácia de estratégias jurídico-judiciais na luta contra violações e/ou por direitos em situações de grave conflito. Ou seja, em conjunturas onde o Judiciário nem sempre atua de maneira imparcial nos contenciosos entre poder econômico e comunidades violadas, há sentido em apelar ao sistema judicial?
Responder a este questionamento é um dos objetivos desta publicação. Em junho de 2013, a Fundação Rosa Luxemburgo promoveu um primeiro seminário internacional sobre Megamineração na América do Sul1. Como consequência deste debate, em abril de 2014 uma parceria entre a Rosa Luxemburgo, a Rede Justiça nos Trilhos (JnT) e a Justiça Global (JG) viabilizou na cidade de São Paulo, Brasil, um encontro de advogados e advogadas de dez países, atuantes em causas que envolvem violações de direitos humanos provocadas por grandes empresas mineradoras. O encontro fez parte de um processo de articulação, debate e troca de experiências sobre as possibilidades de acionamento judicial para proteger direitos de populações atingidas pela instalação de grandes empreendimentos minerários, representando um passo importante na consolidação de uma aliança entre os atores do Sul que litigam contra estes empreendimentos.
Certos de que reunir e publicar relatos destes processos de resistência, que têm por base a atuação jurídica, é uma importante contribuição para o debate sobre responsabilização de empresas em âmbito nacional e internacional, apresentamos aqui artigos de militantes da Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Costa Rica, Colômbia, Honduras, Peru e Estados Unidos. Trata-se de articular a utilização das estratégicas jurídicas com a mobilização social que, combinadas, podem movimentar um debate jurídico e político, em nível doméstico e internacional, sobre empresas como sujeitos de obrigações.
Assim, esperamos que esta publicação possa contribuir tanto com reflexões quanto com informações sobre instrumentos de litígio e processos legais para organizações e defensores de direitos humanos que atuam nos territórios afetados por projetos de megamineração.