– “As condições em Pedrinhas continuam explosivas”, disse Juan Méndez. O Complexo Penitenciário de Pedrinhas foi destaque em relatório da ONU.
– Justiça Global, Conectas, SMDH e OAB-MA lançam relatório sobre violações de direitos humanos em Pedrinhas, resultado de inspeções realizadas nos últimos dois anos.
Foi apresentado, nesta terça-feira (07), ao Conselho de Direitos Humanos da ONU o informe da missão que o relator especial da ONU sobre tortura, Juan Méndez, fez ao Brasil, no ano passado. “Cruel, desumano e degradante”, assim é descrito o cárcere brasileiro. O documento denuncia a situação caótica e violadora que os presídios se encontram, em absoluto desacordo com as normativas nacionais e internacionais. O país vem sendo reiteradamente reconhecido como violador de direitos humanos por organismos internacionais pela situação permanente de ameaça à vida e à integridade das pessoas que se encontram nos cárceres brasileiros. A tortura e maus-tratos são sistemáticas.
De acordo com o relatório, um problema frequente no país é a não garantia de direitos humanos: a evolução da normativa encontra-se em pleno descompasso com a eficácia da lei ou politica adotada para a interrupção das violações. Para Juan Méndez, o Brasil teve progressos legislativos, que não encontram efetividade prática ou implementação, o que torna-se notável pelo tratamento cruel e desumano, torturas e mortes que seguem ocorrendo de forma recorrente, principalmente contra pessoas negras.
As condições de cárcere são desumanas, fruto da superlotação que não garante condições de acesso mínimo a direitos como água, saneamento, assistência legal, dentre outros. O relator considera a superlotação dos presídios brasileiros como endêmica. Hoje, o Brasil tem a 4ª maior população carcerária do mundo, segundo dados do Ministério da Justiça. Juan Méndez aponta que, em alguns casos, o número de presos excede em 300% a capacidade máxima das cadeias.
Segundo o relator, a aprovação de projetos que aumentam o tempo de internação e/ou a redução da maioridade penal podem tornar mais grave as péssimas condições.
A prática da tortura persiste. Ela é frequente e subnotificada, aponta o texto, variando apenas de metodologia e gravidade. Além disso, a presença massiva de armamentos pesados entre os agentes de segurança gera um clima de permanente tensão.
O relator afirma ser fundamental que o país foque em medidas de desencarceramento e não o inverso. A criminalização das drogas, por exemplo, hoje, é responsável por grande parte das prisões, que poderiam ser solucionadas com penas alternativas, reduzindo assim a superlotação. Por mais que o usuário não seja passível de ser preso, de acordo com a legislação nacional, esse sofre a criminalização na prática, já que os tribunais ainda trabalham na lógica de avaliar a intenção e não a quantidade. Nesse sentido, organizações de direitos humanos e movimentos sociais diversas vezes já apontaram a seletividade da justiça criminal, que opta criminalizar ilegalmente com critérios racistas e classistas em detrimento da aplicação do que é previsto na lei.
Outra preocupação de Juan Méndez são os presos provisórios, que somam mais de 40% da população carcerária. Foi recomendado a implementação das audiências de custódia em todo o território nacional e para todos os crimes cometidos que geram prisão. James Cavallaro, Relator Especial para o Direito das Pessoas Privadas de Liberdade da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (OEA), também em visita ao Brasil, na última semana, destacou a importância deste instrumento, afirmando ser fundamental que o judiciário utilize-se de métodos que reduzam o uso desnecessário de prisão preventiva.
O racismo, o machismo e a homofobia permeiam a politica de encarceramento no Brasil
O relatório afirma que os negros são mais vulneráveis à violência policial, tortura, falta de acesso a atendimento médico e à criminalização, e que é perceptível a maior aplicação de penas mais severas aos negros do que aos brancos, pelo mesmo tipo penal. O documento mostra também a fragilidade na qual se encontra a população LGBT dentro dos presídios, que apesar de poucos dados existentes, é notável que é mais vulnerável a violência e tratamentos cruéis, inclusive violência sexual.
Outro ponto observado é a permanência da revista vexatória em familiares, principalmente mulheres, como prática violatória aos direitos humanos.
“As condições em Pedrinhas continuam explosivas” , Juan Mendez
A grave situação do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís (MA), foi destaque no relatório. A superlotação, o trancafiamento permanente dos presos nas celas, a revista vexatória, os agentes fortemente armados, serviços médicos inadequados e alimentação inadequada são fatores que colocam o presídio como potencial alvo de novas rebeliões. É importante lembrar que, entre novembro 2013 e fevereiro de 2014, ocorreu uma série de rebeliões nas unidades do Complexo resultando na morte de mais de 60 detentos.
A Justiça Global, a Conectas, a SMDH (Sociedade Maranhense de Direitos Humanos) e a Comissão de Direitos Humanos da OAB-MA (Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Maranhão) lançaram, no último dia 1º, o relatório Violação continuada: Dois anos da crise em Pedrinhas. Na avaliação das organizações, o governo Federal e maranhense falharam no cumprimento das medidas aplicadas pela Comissão e pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos).
Apesar da redução do número de mortes no Complexo, são contínuas as violações de direitos humanos em Pedrinhas, com presos submetidos a tortura, comida estragada, celas superlotadas e higiene precária.
“Eles jogam bomba aqui dentro da cela. Não tem oxigênio para sair para lugar nenhum. Aí a gente fica aqui, pedindo socorro. Quanto mais a gente grita, mais eles jogam”, relata um preso.
O relatório Violação continuada: Dois anos da crise em Pedrinhas está disponível aqui.
Veja também o informe da visita de Juan Mendez ao Brasil (2015) (espanhol)
Como agente de segurança pública, hoje aposentado, e acadêmico de Direito, sei das limitações e omissões do Estado quanto à melhore condições aos custodiados pelo Estado. O Sistema Penitenciário Brasileiro não cumpri com a sua função há tempos, segundo a ADPF 347 , julgado em 2021 pelo STF. Espero que esse quadro mude o quanto antes, todavia, pela experiência que possuo, isto levará um tempo.
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