Série de oficinas realizada pela Justiça Global com familiares de vítimas no Rio de Janeiro discutiu possibilidades de reparação.
O Brasil tem um dos maiores índices de letalidade policial do mundo. A última edição do Anuário Brasileiro da Segurança Pública informa que 6.430 pessoas foram assassinadas pela polícia no país em 2022, sendo a maioria das vítimas pretas e pardas (83,1%) e jovens (73%) e, principalmente, das periferias do país.
Por trás desses números, os familiares das vítimas – sobretudo mulheres negras mães – e demais movimentos sociais protagonizam a linha de frente pelo combate à violência do Estado, no qual se insere a devida responsabilização das instituições públicas com o reconhecimento das violações de direitos humanos cometidas, readequação do uso das forças de segurança e da atenção jurídica, econômica, social e psicológica aos familiares e comunidades.
Diante disso, a Justiça Global realizou a primeira edição do ciclo de “Oficinas Imaginativas e Afirmativas na Luta por Justiça e Reparação”, para construir uma agenda propositiva de luta contra a violência de Estado a partir de olhar interseccional (de raça, gênero, classe e território).
Em três encontros na sede da JG, entre agosto e setembro, cerca de dez representantes de movimentos sociais, de vítimas e familiares, de favelas e de movimentos negros compartilharam as dificuldades enfrentadas a partir da violência sofrida e esboçaram estratégias de reparação, a partir de questões como: quais direitos sociais precisam ser fortalecidos como políticas de reparação?; O que deve ser feito para a não-repetição das violações de direitos humanos?; e que tipos de políticas de reparação queremos para os problemas estruturais que vivemos diante das violações que sofremos?
Facilitadora do encontro, a coordenadora do programa de Violência Institucional e Segurança Pública da Justiça Global, Monique Cruz, afirma que – além de ser parte de uma luta histórica dos movimentos negros e dos movimentos de mães e familiares de vítimas – o direito à reparação trata de um debate internacional sobre reaver aquilo que pode ser reparado. “Já que quando pensamos nos casos de violência letal, nenhuma reparação trará a pessoa de volta -, ou seja, de garantir que se restaure a condição anterior à violação daquela pessoa, ou família, mas especialmente, de pensar processos coletivos de restituição ou constituição de direitos de toda a sociedade. Reparar e não-repetir é máxima desse debate”, explica.
Estiveram na agenda representantes dos movimentos: Rede de Movimentos e Comunidades Contra a Violência/RJ; Mães de Manguinhos; Mães da Maré; Mulheres em Movimentos da Maré; Rede de Mães da Baixada Fluminense; Mulheres do Morro do Sossego; Movimento Moleque; Mães do Chapadão; Movimento Negro Unificado/RJ; Mães do Jacarezinho, além do defensor de direitos humanos Vanderley Cunha, o Deley de Acari.
As participantes foram apresentadas a uma sistematização sobre medidas de reparação previstas em estândares do direito internacional e o que a Corte Interamericana de Direitos Humanos já determinou ao Brasil e outros Estados da região; além da leitura do relatório da Iniciativa Negra Por Uma Nova Política Sobre Drogas sobre o tema (mais); os pontos resolutivos da sentença da Corte Interamericana no caso da Favela Nova Brasília — que em 2017 condenou o Brasil pelas violações ocorridas em operações ocorridas na favela carioca entre 1994 e 1995 e na condução das investigações sobre o caso (mais); além das recomendações da ADPF 635 – a ADPF das Favelas (mais).