Primeira parte do julgamento da ADPF 635, a ADPF das Favelas, ocorreu em novembro. Movimentos e organizações sociais se mobilizam mais uma vez em favor da ação para frear a violência policial.
O Supremo Tribunal Federal retoma o julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.o 635, a ADPF das Favelas, para 5 de fevereiro de 2025. A primeira parte da análise da Corte ocorreu em novembro do ano passado, com maciça participação da sociedade civil.
Reunindo movimentos negros, de favelas, de familiares de vítimas do Estado e ONGs que apoiam a ação, a Coalizão ADPF das Favelas se mobiliza para mais uma vez acompanhar o julgamento, na perspectiva de conter a violência policial no Rio de Janeiro – que atinge sobretudo pessoas negras e empobrecidas, impulsionada pela chamada “guerra às drogas”.
Após a realização das sustentações orais e da leitura do relatório e do histórico do processo pelo ministro e relator do processo Edson Fachin, em novembro de 2024, o Plenário do Supremo desta vez se concentrará na análise no mérito, com apresentação dos votos e discussão entre os onze ministros.
O que a ADPF das Favelas pode mudar?
Uma decisão favorável, ou seja, o Pleno julgue procedente o questionamento que é objeto da ação, pode ter implicações de longo alcance para o policiamento em favelas e periferias não apenas do Rio de Janeiro como para outras Unidades Federativas estabelecendo um novo parâmetro para operações policiais em áreas densamente povoadas e com histórico de violência.
A expectativa é que, a partir deste julgamento, se dê um passo importante para a criação de um novo modelo de segurança pública, que respeite os direitos humanos e proteja as comunidades vulnerabilizadas, sem sacrificar vidas inocentes em nome de políticas de segurança que só têm aprofundado a violência armada e o medo da população. E ainda que seja possível refrear a lógica violenta e racista sob a qual o modelo de segurança pública vem sendo historicamente pautado no Rio de Janeiro e no Brasil todo.
Participação social inédita
A ADPF n.o 635 foi movida em 20 de novembro de 2019 e deferida pelo STF em 2022. A ação foi movida pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) e conduzida em conjunto com uma série de movimentos negros, de mães e familiares de vítimas da violência policial, de favelas, além de organizações da sociedade civil. Uma das particularidades desta ação é o fato de ser a primeira a ter movimentos sociais entre os amici curiae, fato inédito na história do judiciário brasileiro.
Na véspera da primeira parte do julgamento da ADPF 6335 pelo plenário, uma quase 300 organizações, de diversos setores da sociedade civil, assinaram carta-manifesto em apoio à ação (leia mais). Ao longo do dia do julgamento, representantes de diversos movimentos sociais e organizações da sociedade civil se manifestaram na Praça dos Três Poderes, em Brasília–DF, pelo fim do racismo e da violência policial.
Durante a sessão, cerca de 25 representantes de partes da ação foram ouvidos, entre eles a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, que também apresentou dados dos efeitos das operações policiais na vida da população – dias de escola e de consulta médica perdidos, por exemplo.
A necessidade da elaboração e implementação de mecanismos de controle externo da atividade policial foi um dos temas mais discutidos na primeira parte do julgamento, em novembro. (leia mais).
Quais são os pedidos?
No julgamento, o STF pode decidir sobre uma série de pontos importantes que foram pedidos na ação, incluindo:
- implementação de medidas para garantir maior transparência nas ações policiais, confirmando a obrigatoriedade de uso de câmeras, dispositivos de gravação de áudio, bem como a presença de socorristas durante as operações, dentre outras medidas já concedidas durante o julgamento das medidas cautelares nesta ação;
- diretrizes para investigações mais rigorosas sobre abusos e mortes em operações policiais, incluindo a obrigatoriedade de investigação independente para evitar impunidade;
- desenvolvimento de políticas públicas de segurança alternativas e integradas, voltadas para a redução da violência e para ações de prevenção em vez de intervenções repressivas; medidas específicas para proteger crianças, adolescentes e outros grupos vulneráveis que frequentemente são afetados pela violência policial, incluindo a preservação de perímetros escolares e a priorização de investigações cujas vítimas sejam crianças e adolescentes;
- obrigatoriedade de adoção, pelo Estado do Rio de Janeiro, de um plano efetivo para a redução da letalidade policial, que contemple metas específicas para esta redução (a Coalizão da ADPF 635 apresentou ao Supremo Tribunal Federal diferentes parâmetros, que levariam a uma obrigatoriedade de redução da letalidade, em média, de 70%);
- A criação de mecanismos de monitoramento do plano de redução da letalidade policial e das demais políticas voltadas à garantia dos direitos humanos nas favelas, no âmbito do STF e no Conselho Nacional de Direitos Humanos.