O tempo e a atualidade mostram que o legado do país tem gênero
Neste 8 de março gostaríamos de exaltar mulheres que marcaram a história do Brasil, na luta por liberdade e direitos. Nomes como Dandara dos Palmares, Zeferina, Maria Felipa de Oliveira, Maria do Espírito Santo e Marielle Franco nos fazem relembrar da importante tarefa que temos – a de manter viva na história e na memória, esse legado.
O Brasil carrega historicamente trajetórias de mulheres inspiradoras que revolucionaram o país na luta pela garantia de direitos não somente para elas, mas para todas e todos. Mas ainda assim, ainda que suas lutas fossem para a garantia dos direitos humanos, tiveram seus gritos silenciados por lutar contra uma política de extermínio, de corpos, de falas, de ideias.
Muitas vezes as histórias se repetem em diferentes épocas, em cenários distintos, mas suas lutadoras trazem muitas características em comum. Nesse momento em que são as mulheres a maioria na linha de frente do enfrentamento ao Covid-19 estamos vendo que as mãos que garantem o alimento dentro de casa, as mãos que levam as cestas básicas aos que mais precisam, diante do cenário de pobreza que atravessa o país, são as mesmas mãos que carregam os caixões. São mãos negras, de mulheres periféricas.
Acreditamos ser necessário exaltar a mulher negra e despertar reflexões também neste dia marcado como o Dia Internacional da Mulher. Coragem é um substantivo mínimo para traduzir em uma palavra o que essas mulheres, de ontem, de hoje e de amanhã, tinham e têm em comum por defender a nossa gente em um país onde sempre foram as maiores vítimas da necropolítica, machismo, feminicídio e extermínio da população negra.
Mulheres negras enquanto protagonistas de uma história de luta e resistência
Desde o período da colonização até a era da democracia, ocorreram diversos levantes liderados por mulheres que guerrearam pela liberdade de seu povo e pela luta por direitos humanos. Entre elas, está Dandara dos Palmares. Na Serra da Barriga, então capitania de Pernambuco, no dia 6 de fevereiro de 1694, Dandara era assassinada durante a disputa no Quilombo dos Palmares, onde também vivia com seu marido, Zumbi. A guerreira mais famosa do país não concordava com as imposições da Coroa Portuguesa e lutou até o fim dos dias pelo território de seu povo.
Na Bahia, Estado que concentra o maior número de pessoas negras do Brasil, encontramos o enredo da então líder do quilombo do Urubu. Zeferina era o seu nome. Conta a história que a angolana trazida ao Brasil ainda criança confrontava capitães do mato com arco e flecha.
Já na Ilha de Itaparica, na região metropolitana de Salvador, Maria Felipa aprendeu capoeira para se defender e tinha como objetivo libertar seus avós e descendentes escravizados. Para isso, numa simples jangada, a marisqueira, pescadora e trabalhadora braçal enfrentava mais de 20 km de intempéries durante as madrugadas embaladas sobre o agitado mar da Baía de Todos os Santos com destino à capital baiana para levar informações sobre as movimentações das caravelas portuguesas, descobertas por ela mesma durante o dia, para o Comando de Libertação, que ficava na capital baiana.
Defensora dos direitos humanos na luta socioambiental, Maria do Espírito Santo Silva atuava na defesa da floresta como forma de subsistência e na criação de uma reserva extrativista no assentamento, onde existia uma das últimas áreas nativas de castanha-do-pará na região. Maria morava numa área de 20 hectares com 80% de área verde preservada, no município de Nova Ipixuna, no Pará, que passou a ser cobiçada por madeireiros, grileiros e fazendeiros. Lutou incansavelmente em defesa da floresta e de formas de viver mais integradas ao meio ambiente.
Com a mesma bravura e ousadia, em nosso tempo, no Rio de Janeiro, a história do Brasil foi marcada eternamente pela trajetória e trabalho social e político de Marielle Francisco da Silva. Com veemência e honradez, Marielle Franco reagiu contra as violações aos direitos fundamentais no país. Marielle fez da sua a voz de mulheres, homens, jovens e crianças negras e faveladas e LGBTQIA+, denunciando violações e construindo projetos de leis que favorecessem as pessoas de forma justa, com o objetivo de promover a efetivação de seus direitos. Suas ideias ecoam na mente e no coração de quem sonha e luta pelo respeito aos direitos humanos e pela equidade no Brasil.
Essas são algumas das muitas histórias de mulheres negras que marcaram a nossa história e que deixaram seus legados para mostrar que são as verdadeiras protagonistas da luta e resistência em nosso país. Que os nossos corações e ideais estejam alinhados e juntas lutaremos contra toda e qualquer ameaça de governos e toda forma de autoritarismo. Porque a nossa vida pode acabar, mas os nossos sonhos são eternos.