Audiência acontece nesta quarta-feira, dia 02, às 11h, com transmissão ao vivo no canal da Corte IDH no Youtube
A Corte Interamericana de Direitos Humanos convocou o Estado brasileiro a prestar esclarecimentos sobre ainda não ter adotado medidas eficazes de proteção à vida e à integridade de pessoas dentro dos sistemas de privação de liberdade, voltados tanto para adultos quanto para adolescentes. A audiência ocorrerá, de forma virtual, durante o 142º Período Ordinário de Sessões, nesta quarta-feira, dia 2, a partir das 11h (horário de Brasília) e será transmitida ao vivo no canal do Youtube da Corte IDH. Além do Estado brasileiro, a audiência terá a participação da Justiça Global, Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Serra/ES, Conectas Direitos Humanos, Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, Serviço Ecumênico de Militância nas Prisões (SEMPRI), Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH), além de representantes da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
O Governo do Brasil responderá pelo descumprimento de medidas provisórias proferidas pela Corte aos Complexo Penitenciário de Curado (PE), Complexo Penitenciário de Pedrinhas (MA), Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho (RJ) e à Unidade de Internação Socioeducativa (UNIS/ES). A Justiça Global atua como representante das vítimas em parceria com outras organizações em três dos quatro casos (Curado, Pedrinhas e UNIS).
Em documento enviado à Corte Interamericana de Direitos Humanos, as organizações denunciam a negligência do Estado brasileiro em garantir medidas para a erradicação do risco à vida e integridade dentro do sistema de privação de liberdade. Documentos comprovam que são irreparáveis os danos causados às pessoas presas, funcionários e visitantes. No Complexo Penitenciário do Curado, em Pernambuco, por exemplo, entre janeiro de 2020 e maio de 2021, nove pessoas foram assassinadas. Em um dos casos, um preso teve um dos pés decepado e o corpo queimado. Na mesma ocasião, outras três pessoas ficaram feridas.
O Curado enfrenta uma superlotação extrema. Segundo dados da Secretaria Executiva de Ressocialização (Seres), são 5.021 pessoas que dividem um espaço construído para 1.819. Outro grande problema é a falta de controle pelo Estado da referida Unidade, devido à permanência da figura dos chaveiros (presos que têm o controle das unidades prisionais). Desde 2011, tramita no Sistema Interamericano de Direitos Humanos o caso sobre as seguidas violações de direitos humanos no Complexo Penitenciário do Curado. O caso foi apresentado pela Justiça Global, SEMPRI e Pastoral Carcerária. Em dezembro de 2018, a Corte IDH recomendou que não fossem abertas novas vagas no local. A decisão foi proferida após uma inspeção realizada, em junho de 2016, constatar a superlotação.
Já no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, no Maranhão, as organizações denunciam o uso abusivo de armas menos letais contra as pessoas presas. Em todas as unidades prisionais do complexo há denúncia de maus tratos e tortura por uso de balas de borracha, spray de pimenta e gás lacrimogêneo. Há também imposição de sofrimento físico e psíquico causado pelas más condições estruturais das unidades prisionais, entre elas falta de iluminação natural e artificial, da pouca ou nenhuma circulação de ar que atrelada a superlotação gera aumento na temperatura ambiente. De acordo com os dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na Plataforma Geopresídios, o Estado do Maranhão dispõe de 186 estabelecimentos prisionais com o total de 9.949 vagas sendo que destes, 43 são classificados como “situações péssimas”. Todas as unidades que integram o Complexo Penitenciário de Pedrinhas estão inseridas nesta classificação.
Em 2013, a Justiça Global, a Conectas Direitos Humanos, Sociedade Maranhense de Direitos Humanos e a OAB/MA solicitaram à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) medida cautelar obrigando o país a agir imediatamente para conter novas violações em Pedrinhas. Em 2014, devido a falta de melhora nas condições, a CIDH remeteu o caso à Corte.
Na Unidade Socioeducativa do Espírito Santo (UNIS/ES), as organizações de direitos humanos apontam situações críticas referentes à crescente militarização do sistema socioeducativo do Espírito Santo, práticas de tortura e maus tratos e apresentam questões sobre o grave cenário de crise sanitária causada pela pandemia de Covid-19 e suas consequências para a vida e a integridade dos adolescentes internados na unidade.
Dentre os castigos realizados no local está o isolamento respiratório, voltado, desde março, para os adolescentes que apresentem sinais de síndromes gripais. Esse mesmo lugar usado hoje para o isolamento de adolescentes com sintomas gripais, já foi usado no passado como espaço de isolamento para o castigo.
A situação de tortura e maus tratos dos adolescentes na unidade socioeducativa do Espírito Santo vem sendo denunciada ao Sistema Interamericano desde 2009, pela Justiça Global e o Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Serra/ES. Na época, havia relatos de abusos sexuais e de uso de técnicas de tortura semelhantes às utilizadas pelos Estados Unidos no Iraque e durante a ditadura militar no Brasil. Em 2011, a Corte Interamericana emitiu a primeira resolução exigindo que fossem adotadas medidas para proteger a vida e a integridade pessoal de toda e qualquer pessoa que se encontrasse na UNIS.
A audiência também tratará de como a pandemia agravou a situação de pessoas no cárcere. De acordo com dados recentes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Brasil registra 425 mortes no sistema prisional. Ainda nesse contexto, pessoas privadas de liberdade têm morrido por hipovitaminose, ou seja, por serem colocadas em condições de vulnerabilidade e por receberem alimentação inadequada, por não terem acesso à luz solar e exercícios físicos, em diferentes estados do país, inclusive em Pernambuco.