Em apresentação do relatório sobre tóxicos e direitos humanos, a organização chamou a atenção para projeto de produção de hidrogênio verde no Maranhão, em vias de instalação.
A Justiça Global foi à Genebra para denunciar na 54ª sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas as ameaças aos direitos humanos nas propostas de transição energética para enfrentar as mudanças climáticas. A organização mencionou o projeto Grão-Pará, de produção de hidrogênio verde na Amazônia do estado do Maranhão, no nordeste brasileiro, que se encontra em vias de ser instalado. Para a organização, o hidrogênio verde é uma das soluções de transição energética controversas, que deve ser analisada com cautela.
A apresentação oral feita pela coordenadora da Justiça Global, Monique Cruz, foi realizada após o informe do relator especial sobre tóxicos e direitos humanos, Marcos Orellana, que aponta que algumas soluções propostas para enfrentar a mudança climática não estão alinhadas à proteção dos direitos humanos. A defensora de direitos humanos afirma que as definições de hidrogênio emergem das necessidades do Norte Global, especialmente da Europa e Alemanha, que avança na transição energética.
“Na transição energética, o comércio internacional de hidrogênio verde poderá desempenhar um papel-chave, mas não pode ser encarado como uma fórmula mágica para alcançar a neutralidade climática na Europa. Quais os riscos de impactos negativos para as pessoas e a natureza no Sul Global, se o hidrogênio verde for produzido em grande escala para exportação?”, disse Monique Cruz em seu pronunciamento.
Em vias de ser instalado, no estado do Maranhão, o Projeto Grão-Pará é um grande projeto de produção de hidrogênio verde, que prevê também Porto e Ferrovia. O principal empreendimento previsto é o Terminal Portuário de Alcântara. A Estrada de Ferro do Maranhão, de aproximadamente 520 km, prevê ligar este Terminal Portuário à Açailândia, permitindo carga de grãos. O Hub de Energia Verde será destinado à produção de Amônia e Hidrogênio Verde para o mercado interno e externo.
“O Projeto Grão-Pará irá gerar danos ao ambiente e violações de direitos humanos a populações indígenas, quilombolas e quebradeiras de coco, populações tradicionais que gozam de proteção legal específica. O projeto é discutido há seis anos e ainda não há informações disponíveis sobre o licenciamento ambiental e não foi realizada Consulta Prévia, Livre e Informada, conforme preceitua a Convenção no 169 da Organização Internacional do Trabalho”, denuncia Cruz.
Os municípios de Alcântara e Açailândia já são impactados por grandes empreendimentos e são as duas pontas da ferrovia prevista no Projeto Grão-Pará. Em Alcântara, na Região Metropolitana de São Luís do Maranhão, está localizada a maior concentração quilombola do Brasil. Segundo dados do Censo do IBGE, 84,6% dos moradores ou cerca de 15.616 pessoas se autodeclaram quilombolas O território é afetado há 40 anos pela instalação de uma base espacial militar de lançamento de foguetes, que alterou o modo de vida tradicional.
Já o município de Açailândia é impactado pela cadeia produtiva da mineração. No bairro de Piquiá de Baixo, mais de 1.100 pessoas sofrem com a poluição do rio, ar e solo; além de ser impactado pela Estrada de Ferro da mineradora Vale S.A.
“Nos preocupa como as soluções de descarbonização serão apresentadas. Quem vai pagar a conta da neutralidade climática do Norte Global? A transição energética deve ser justa e a ameaça da crise climática não deve servir como pretexto para que empresas e governos agravem ainda mais a situação de direitos humanos”, completa Monique Cruz ao mencionar que o Brasil tem se recolocado no cenário internacional, na agenda ambiental e nas negociações climáticas, e irá sediar a 30ª Conferência das Partes (COP) do Clima, em 2025.